Crise com Congresso esvazia cerimônia de Lula: Motta e Alcolumbre serão ausência em sanção do IR
A cerimônia de sanção da ampliação da faixa de isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil, tratada pelo Planalto como um gesto simbólico para tentar reorganizar a relação com o Congresso, será marcada por duas ausências significativas em meio à crise. Convidados para o evento desta quarta-feira, os presidentes da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), e do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), não irão ao Palácio do Planalto, justamente no momento em que o governo enfrenta seu período mais crítico de tensão com o Legislativo neste terceiro mandato de Lula.
Pela manhã, a assessoria de Motta informou que o deputado “cumpre agenda interna” e não participará. A decisão, porém, não impediu o presidente da Câmara de publicar nas redes uma mensagem celebrando a sanção e exaltando a “união dos Poderes”, num tom institucional que contrasta com o ambiente real de desgaste.
“Este é o resultado da união dos Poderes em favor do Brasil. Com respeito às atribuições legislativas, diálogo e equilíbrio, o país avança”, escreveu Motta e seu perfil no X.
No Senado, Alcolumbre também optou por se ausentar. O gesto ocorre no auge do atrito com o governo devido à indicação do advogado-geral da União, Jorge Messias, para a vaga de ministro do STF deixada por Luís Roberto Barroso. Esta escolha contrariou o presidente da Casa e levou ao rompimento com o líder do governo, Jaques Wagner (PT-BA).
Alcolumbre considera que o Planalto atropelou a articulação política e reagiu colocando em votação uma “pauta-bomba”: aprovou um projeto que estabelece aposentadoria integral e paritária para agentes comunitários de saúde (ACSs) e agentes de combate às endemias (ACEs). O governo estima um impacto de R$ 100 bilhões em dez anos.
O senador sinalizou também que não atuará para proteger o governo na disputa do PL Antifacção e ainda marcou a sabatina de Messias na CCJ para 10 de dezembro, em um intervalo curto que pode dificultar o giro político do indicado entre os senadores.
Crise acumulada
A ausência simultânea dos dois presidentes reflete um acúmulo de atritos que, pela primeira vez, se manifestam de forma coordenada nas duas Casas.
Na Câmara, o ponto de ruptura foi o desgaste entre Hugo Motta e o líder do PT, Lindbergh Farias (RJ). A relação já vinha tensionada desde a PEC da Blindagem e piorou na votação do projeto antifacção, quando Motta escolheu um opositor, Guilherme Derrite, para a relatoria. A situação se agravou com a fuga de Alexandre Ramagem (PL-RJ) para os Estados Unidos — episódio em que petistas passaram a acusar Motta de leniência com o deputado condenado na trama golpista. O mal-estar levou integrantes da bancada a pedirem desculpas, mas selou um distanciamento.
Desde então, Motta tem dito a interlocutores que não está disposto a dialogar com a ministra das Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, reforçando o cenário de ruptura. Os dois sempre tiveram uma boa relação, ao contrário do ex-presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), com o então ministro que comandava a articulação política do governo, Alexandre Padilha.
Cerimônia esvaziada
A sanção do Imposto de Renda era vista pelo Planalto como uma oportunidade de exibir convergência institucional em torno de uma pauta considerada estratégica e extremamente popular. A relevância não só para a agenda econômica, mas também para o ano eleitoral, uma vez que foi uma das promessas da campanha de Lula em 2022. A presença de Motta e Alcolumbre seria usada pelo governo como sinal de retomada do diálogo após semanas de tensão.
O esvaziamento do evento, porém, aponta na direção contrária: o Congresso não vê sinal de trégua, e tanto Câmara quanto Senado optaram por demonstrar distância no momento em que o Planalto buscava transmitir a imagem de unidade.